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Marília Mendonça, missionária

Gosto de pensar no ser humano como missionário na Terra. Temos uma missão nessa breve passagem terrena. E é uma tarefa que nos coloca em provação todos os dias, pois o pós-morte é o grande segredo da vida. Muitos fazem algo por aqui pensando em vida após a morte. Outros preferem viver o hoje como se não houvesse amanhã. A balança desses dois paradigmas é o que considero ideal para levar esta missão de modo mais palatável.

A missão de Marília Mendonça foi muito bonita e nobre. Deixa um legado importante muito além da fama e do dinheiro. Orgulhou a mãe dela porque foi uma garota persistente, que não topou desistir com os primeiros tombos em busca da realização do seu sonho musical. Deixou uma criança maravilhosa no mundo, e as pessoas que tiveram a oportunidade de conviver com Marília Mendonça garantem: era mãe, filha e mulher abençoada.

A chamada Rainha da Sofrência combateu o bom combate, e a vida tem dessas: nada vem de graça ou com muita facilidade. Eu vejo missões em cada ser humano, da Marília Mendonça à mãe do meu filho, e também, por exemplo, no jovem de 20 anos que foi executado a tiros em frente à Assembleia de Deus, em Sarandi, nesta segunda-feira, 8.

Uma semana difícil que se iniciou desta forma para a família daquele jovem. Seis tiros, óbito no local, missão interrompida. A polícia encontrou uma faca com o garoto, que talvez buscava um mínimo de proteção após ameaças dos algozes.

Algumas pessoas têm a sorte de reunir condições suficientes para descobrir ainda jovem a sua missão. Tem gente que verá o despertar apenas na velhice. No fundo, a gente pelo menos suspeita qual o grande motivo pelo qual estamos habitando o mundo. Mesmo quando seis tiros violentam a nossa pele, perfuram nossos órgãos vitais e interrompem uma vida fugidia, suspeitamos sobre o que se trata ser a nossa missão.

É comum ler por aí o relato de pessoas que acompanharam pacientes à beira da morte e que se arrependem de algumas atitudes durante toda a vida. E parece ser algo muitas vezes ligado ao tempo desperdiçado pela busca do dinheiro. Sempre queremos mais dinheiro, mais conforto, mais coisas, e nunca percebemos que o dinheiro não paga o sorriso de um filho, a gentileza descompromissada do próximo ou o amor inesgotável de avós.

Ninguém é doido de rasgar dinheiro, mas agora eu quero falar um pouco da missão que acredito ter nessa breve passagem: numa espécie de revolução silenciosa e interna, conseguir me desapegar do mundo e me reencontrar com a singeleza da alma. Em conexão com meus verdadeiros valores, alcançar nitidez no olhar, a emoção com a arte e a beleza e a empatia ditando os passos seguintes.

Menos ansiedade, mais propósito e uma vida em que cada segundo vivido é um ato de agradecimento e de possibilidade do renascer, do perdão e do reencontro com a própria essência. Marília Mendonça viveu em sua essência e se torna um grande exemplo para todos nós. Neste sentido, cumpre-se uma missão e se torna referência no viver. Missões também servem como lições. E seremos eternamente alunos.

Wilame Prado
pradowil@gmail.com

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