A cerimônia estava marcada para as seis da manhã. Isso mesmo: ao nascer do dia. Porque o maria-fumaça passava pela estação de Cambuci-RJ às sete e meia.
Noivos e convidados já estavam de pé antes das cinco; a noiva por certo nem dormira. Seis horas em ponto, escutava-se a marcha nupcial. Qualquer descuido com o relógio significaria o risco de perder o trem.
Casamento bonito, solene, com missa e cantos em caprichado latim, comovente sermão do padre Othon. Terminou às sete, igualmente em ponto. Em meia hora deveríamos, após trocar de roupa e cortar o bolo, estar prontos para o embarque na estação.
O normal era o trem atrasar, mas justamente naquele sábado quebrou a regra: chegou na horinha… sem que lá estivéssemos. O recurso foi os convidados plantarem-se em cima da linha, na frente da locomotiva, impedindo a partida. Sorte que o maquinista estava de bom humor e acabou aderindo à brincadeira, aproveitando para comer a fatia de bolo que alguém se lembrou de oferecer-lhe. Entre podes e não podes, gritos, apitos e assobios, espera-um-pouco e espera-um-pouco-mais, uns quinze minutos se passaram… e o trem ali parado.
Quinze ou vinte minutos, sei lá. Naquele alvoroço, o embarque foi um tumulto. Além de nós, que viajaríamos para o Rio de Janeiro, iriam juntos até São Fidélis e Campos dezenas de convidados. Gente cantando, gente tocando violão, gente gritando “é pique, é pique, é pique…”, gente jogando arroz… O recolhedor de passagens quase endoidou naquela confusão.
Após o desembarque dos barulhentos convidados, Lucilla e eu, enfim sós, poderíamos prosseguir tranquilos nossa lua de mel sobre trilhos, o trem rolando pachorrento a 40 ou 50 quilômetros por hora, soltando fumaça, apitando em cada curva, batendo sinos…
Porém o “enfim sós” pouco durou. Por obra do atraso forçado na estação das núpcias, ficamos famosos e superparicados. Os passageiros todos se fizeram figurantes da história, batendo palmas, gritando vivas, se acercando para abraçar os dois pombinhos. O maquinista mandou perguntar se estávamos bem. O vendedor de jornais ofereceu os matutinos de graça: “Pra vocês escolherem um bom programa na capital”. O baleiro trouxe bombons: “Não precisam pagar, é cortesia da casa”.
Passamos dois dias no Rio, um dia em Aparecida, dois dias em São Paulo, e dali para Maringá. O aeroporto era ainda de chão batido. A Avenida Brasil, por onde passou o táxi, não tinha asfalto. Um poeirão de dar medo. Lucilla não comentou nada, mas até hoje, sessenta e quatro anos depois, fico imaginando o que ela pensou naquele instante. No mínimo sentiu uma vontade enorme de pegar o avião de volta.
Mas quando a gente é jovem tudo é festa. Em pouco tempo ela se adaptou ao jeito maringaense de viver. Graças a Deus.
A. A. de Assis
Foto – Reprodução
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