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Finados?

O calendário gregoriano marca o dia 02 de novembro como dia de finados, quando ocorrem cerimônias religiosas da tradição cristã católica, relembrando  dos entes queridos que já se foram, para  rezar pelas almas deles.

         Pela doutrina católica, as almas da maioria dos mortos passariam pelo purgatório, num processo de purificação, necessitando de orações dos ‘vivos’ para alcançarem a salvação. Nesse contexto, o Dia de Finados era conhecido na Idade Média como “Dia de todas as Almas”, e sucedia o “Dia de todos os Santos”, no dia 1º de novembro.

         Parece-nos contraditório que se use o termo ‘finado’, que significa, que findou, deixou de existir, acabou, e ao mesmo orar por eles, pedindo a Deus que os salve do purgatório, como se continuassem existindo, portanto sem findar-se.

        Sobre a morte, é certo que todos teremos o dia e  não a deveríamos  temer, pois trata-se de um acontecimento natural,  que apenas interrompe a vida física, para continuidade espiritualmente em outra dimensão. Há quem entenda que morrer é se livrar da prisão carnal, como um passarinho que se livra da gaiola. Que a vida neste planeta é apenas um momento, uma passagem diante da eternidade, uma oportunidade de resgate, aprendizado para vivenciar o amor.

        A propósito, encontrei um texto de Lígia Guerra, postado por uma amiga, a Neia Zampieri, que aqui resumimos e adaptamos, para ampliar reflexões sobre  o tema, o título é:  ‘O dia em que eu morri’, vejamos:

‘Vou contar como tudo aconteceu. A minha primeira parcela de morte aconteceu quando acreditei que existiam vidas mais importantes e preciosas do que a minha. O mais estranho é que eu chamava isso de humildade. Nunca pensei na possibilidade do auto-  abandono. Morri mais um pouquinho no dia em que acreditei em vida ideal, estável, segura e confortável. Passei a não saber lidar com as mudanças. Elas me aterrorizavam. Depois vieram outras mortes.

Recordo-me que comecei a perder gotículas de vida diária, desde que passei a consultar os meus medos ao invés do meu coração. Daí em diante comecei a agonizar mais rápido e a ser possuída por uma sucessão de pequenas mortes. Morri no dia em que meus lábios disseram não, enquanto o meu coração gritava, sim! Morri quando abandonei um projeto pela metade por pura falta de disciplina.

Morri no momento em que me entreguei à preguiça. No dia em que decidi ser ignorante, bulímica, cruel, egoísta e desumana comigo mesma. Você pensa que não decide essas coisas?  Decide sim! Sempre que trocamos uma vida saudável por vícios, gulodice, sedentarismo, drogas e alienação intelectual, emocional, espiritual, cultural ou financeira, estamos fazendo uma escolha entre viver e morrer.

Morri outra vez, no dia em que abri mão dos meus sonhos por um suposto amor. Confundi relacionamento com posse e ciúme com zelo. Morri no dia em que acreditei na crítica de pessoas cruéis. A pior, eu mesma. Morri no dia em que me tornei escrava das minhas indecisões. Quando prestei mais atenção às minhas rugas do que aos meus sorrisos. Deixei de viver quando invejei , fofoquei e difamei, sem perceber o quanto havia me tornado uma vampira da felicidade alheia.

Pereci no dia que acreditei que preço era mais importante do que valor e  me tornei competitiva, ficando  cega para a beleza da singularidade humana. Depois que troquei o hoje pelo amanhã, que nunca chegou, ficando   vazio, sem história, música ou cor.

Não morri de causas naturais. Fui assassinada  por  desculpas e equívocos, que  ainda assim foram decisões. Irônico é que as pessoas que vivem bem não têm medo da morte real. As que vivem mal é que padecem desse sofrimento, embora já estejam mortas. É dessas que me despeço.

E para concluir, o 02 de novembro não é o dia de finados. Cremos na sobrevivência da Alma e que somos uma Alma que estamos num corpo físico. Só o corpo morre, então continuamos vivos.

 Neste sentido, os que se foram podem ser chamados de ‘vivos mortos’, ( sem o corpo físico) finados, jamais.

Akino Maringá, colaborador

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