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A flor que veio do Lácio

Numa bela região da Itália, tendo por moldura a oeste o mar Tirreno, a leste os Apeninos, ao norte a Toscana e a Úmbria, e a Campânia ao sul, havia o Lácio.  Seus habitantes falavam o  latim, então modesto ramo linguístico brotado do grande tronco indo-europeu.

     No Lácio, um pouco segundo a lenda, um pouco segundo a história, no ano 753 a.C., às margens do Tibre, numa paisagem onde a natureza caprichosamente plantou charmosascolinas (dizem que sete), nasceu Roma, a eterna. Mais que a história, manda ainda a lenda (aliás sempre mais bonita) que se credite aos gêmeos Remo e Rômulo, mais a Rômulo do que a Remo, a fundação da nobre urbe. 

     Roma cresceu, virou império, tomou conta de toda a Itália, acabou estendendo o seu poder por meio mundo. Rica e forte, pôde ao mesmo tempo tornar-se importante polo cultural, graças principalmente ao que aprendeu com os gregos. À influência recebida da cultura grega deve-se também, em boa parte, o notável enriquecimento do latim, aos poucos transformado em primorosa e encantadora língua.

     Havia, porém, duas modalidades de latim: o clássico (erudito), usado na produção literária, monitorado pelos gramáticos e adotado como padrão pela restrita roda dos romanos cultos; e o latim vulgar, falado (e raramente escrito) pelos mortais comuns.

     De colônia em colônia, ia Roma espalhando mundo afora a sua língua. Em cada região conquistada, a primeira providência dos dominadores era impor o latim como idioma oficial. Não o latim chique dos discursos de Cícero e dos versos de Virgílio, mas o latim povão – a fala descontraída dos soldados e dos barnabés do império.

     Ocorre ainda que,  no contato com os povos subjugados, ia o latim assimilando parte do vocabulário e marcas do sotaque e da sintaxe de cada região. Daí resultou que, passados alguns séculos, não era mais o latim que se falava: eram dialetos, logo consolidados como novos idiomas.

     Assim se formaram as chamadas línguas neolatinas, entre as quais o italiano, o francês, o romeno, o catalão, o espanhol,  o português.

     A chegada dos romanos à península Ibérica  (onde estão hoje Espanha e Portugal) data do século 3a.C. Na época, a região era habitada pelos celtiberos, sabendo-se que por ali também passaram gregos, fenícios, cartagineses e outros grupos. No ano 711 d.C., a península foi invadida pelos árabes, que ali permaneceram durante cerca de 700 anos, até serem expulsos definitivamente.

     Em meio a todas essas escaramuças, ao se encerrar o primeiro milênio já se definira a língua espanhola e estava nascendo a língua portuguesa, liricamente rebatizada, muitos séculos depois, pelo nosso Bilac, como “última flor do Lácio”. 

A. A. de Assis
Foto – Reprodução

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