Do salto nas miopias à depressão, da dificuldade de aprendizagem ao suicídio, do cyberbullying a obesidade, diversos são os danos causados pela intensa utilização de telas na infância e adolescência. Um grave problema que tem criado a primeira geração com QI (quociente de inteligência) menor do que o dos pais e é apontado como uma pandemia.
A tecnologia e o uso excessivo das redes sociais foram debatidos na Assembleia Legislativa do Paraná por uma banca de especialistas que considera a evolução tecnológica como recurso fantástico, mas ao mesmo tempo sem controle e sem ética com crianças e adolescentes, promovendo grandes impactos na saúde física, mental e nas relações sociais.
A audiência pública promovida pela deputada estadual Márcia Huçulak (PSD) nesta quinta-feira (22), reuniu profissionais e gestores em diferentes áreas relacionadas ao tema, como saúde, educação, comportamento e Direito para buscar soluções de enfretamento e ampliar o discurso sobre o assunto. Aberta ao público, contou também com a presença de estudantes do 5º ano da Escola Interativa, que participavam do programa Visita Guiada, realizado pelo Legislativo, e também puderam questionar os integrantes da mesa sobre um assunto no qual são o foco.
“As pessoas precisam saber que o uso excessivo de telas em crianças faz atrofia cortical no cérebro (síndrome neurodegenerativa), com danos para o resto da vida. Podemos estar formando uma geração que terá muitos problemas. Hoje já tem pesquisa científica provando aumentado da ansiedade, tentativas de suicídio, depressão e crianças que não se conectam. O futuro dessa geração pode estar comprometido se não tomarmos atitudes como governo e sociedade. Nossas crianças e adolescentes não têm o luxo de esperarmos mais evidências, temos de agir”, afirmou a parlamentar.
“Hoje há uma pandemia do uso virtual das telas, especialmente no celular, sem controle da família e escolas, com acesso livres a cinco bilhões de internautas. Infelizmente não assusta os pais e os meios de educação como deveria. É um mundo fantástico, pena que junto estão os perversos e o consumo, pois somos produtos para a internet e nossas crianças mais ainda”, avaliou a médica e presidente do Departamento Científico de Prevenção e Enfrentamento das Causas Externas da Sociedade Brasileira de Pediatria e da Paranaense de Pediatria, Luci Yara Pfeiffer.
Ela também é idealizadora e coordenadora do Programa DEDICA (Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente) e citou a questão do sedentarismo, o aumento dos problemas auditivos, oftalmológicos, com estrabismo irreversível, e a previsão de que 50% da geração atual ficará míope em 20 anos, e 10% dessa miopia levará à cegueira. “Mas na saúde mental está o dano mais exuberante, por criar modelos do ‘eu ideal, trazer o desconhecido como íntimo, criar laços de afetos e dependências virtuais e a fuga da realidade. Bem como uma série de violências promovida nos meios virtuais, aumentando os casos de depressão e tentativas de suicídio”, apontou a médica.
Em 2023, pela primeira vez a ansiedade entre crianças e jovens superou, em número de registros, a de adultos, segundo a Rede de Atenção Psicossocial do Sistema Único de Saúde (SUS). O Brasil é o terceiro país que mais consome redes sociais no mundo. São mais de 131 milhões de contas ativas, das quais 127 milhões (97%) são usuários únicos das redes sociais. A média de uso é de 10 horas por dia na internet e 3h41min nas redes sociais, de acordo com Comscore, empresa norte-americana de análise da internet.
Família e escolas
A união entre famílias e as escolas foi citada como uma das alternativas para encorpar ações de enfrentamento. “Nas nossas formações com os professores há preocupação de como trabalhar com estudantes para tornar aulas mais educativas e atrativas. A gente promove muitas ações também de alerta aos pais, com formações por meio de lives, por meio de orientações e a nossa conversa sempre com as famílias e os pais é sempre observar o tempo de uso, desse equipamento dentro das famílias”, disse a gerente de Inovação Pedagógica, no Departamento de Desenvolvimento Profissional da Secretaria Municipal da Educação de Curitiba, Silmara Campese Cezário. “Precisa ter uma orientação aos pais sobre qual é a necessidade de entregar um tablet ou um celular na mão de uma criança, muitas vezes, de quatro ou cinco anos. As famílias devem se orientar e buscar informações”, acrescentou.
A Sociedade Brasileira de Pediatria recomenda que não haja nenhum uso de telas por crianças até dois anos de idade; até uma hora de uso dos três aos cinco anos e no máximo duas horas dos seis aos 18 anos de idade. “Estamos em uma sociedade hedonista, do prazer pelo prazer, individualista, materialista e precisamos a olhar para isso, para o convívio no espaço da família e da escola”, afirmou a médica e coordenadora da Linha de Cuidados da Saúde da Criança da Secretaria Municipal de Saúde, Cristiane Maria Leal Vardana Marangon, que elogiou a iniciativa. “Parabéns pela mobilização porque é pela conscientização, sensibilização e ações diversas que podemos enfrentar essa questão”.
Adequação
De acordo com o professor de tecnologia Everton Drohomeretski, a previsão para 2030 é de que 800 milhões de vagas e atividades que vão desaparecer, para 2025 são 80 milhões. O Fórum Econômico Global prevê, ainda, que em cinco anos, 40% do conhecimento dos adultos não serão mais necessários, pois serão automatizados nas mais diversas áreas.
“Tem essa questão de nos adequarmos às mudanças. Mas hoje estamos todos no celular. Sem atenção, as crianças procuram isso em outro lugar e encontram novos heróis nas redes virtuais, com algoritmos atrativos”, afirmou Drohomeretski, que também é diretor-administrativo do Sindicato das Escolas particulares do Paraná (Sinepe/PR), e possui diversas formações internacionais nas universidades de Harvard, Stanford e Tampere University of Applied Sciences, na Finlândia.
Ele comentou sobre a dificuldade de concentração das crianças e adolescentes, acostumado as uma oferta intensa de estímulos e do mundo virtual, bem como a inabilidade para frustrações.
Legislação
A advogada Renata Kobus, que integra a Comissão de Direito Digital da Ordem dos Advogados do Brasil, reconheceu que, infelizmente, a tecnologia anda atrás em relação à questão legislativa. “O problema não é a tecnologia, mas a utilização dela. São vários impactos hoje como as questões envolvendo o cyberbullying, o sexting (divulgação de conteúdos eróticos e sensuais através de celulares) e outros, com desafios para a legislação atual, que está tentando se adaptar. Há algumas leis sendo aplicadas, mas é necessário conformidade dessas leis com essa questão tecnológica Com certeza, audiência como estar é um dos grandes passos para a gente ter essa mudança na legislação, mas também uma mudança cultural desse uso da tecnologia na sociedade 4.0”, completou.
Assessoria de Imprensa
Foto – Alep