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Não fale sobre o que você não conhece

A beleza do pensamento de Paulo Freire se revela ao longo da leitura de cada uma de suas obras. Embora criticado por algumas pessoas, o educador brasileiro deixou como legado um modo ético de fazer educação. Mais que isso, diria, deixou-nos orientações preciosas sobre como viver bem. Por exemplo: qual seria a atitude ética de quem se propõe a criticar algo, alguém ou mesmo uma ideia?

Vivemos um tempo maluco. Sobra violência verbal, faltam empatia, tolerância e respeito. Mas falta outra coisinha fundamental: conhecimento sobre o que se fala. A fase está tão complicada que tem gente que prefere acreditar em político a depositar a confiança na fala dos cientistas.

A situação vai mais longe. Muita gente critica algo ou alguém com base em quinze segundos de uma informação que recebe e até numa frase que lê fora de contexto. O próprio Paulo Freire é um exemplo disso: o autor é questionado, achincalhado por pessoas que nunca leram com profundidade nenhuma de suas obras.

Para todas essas situações, as recomendações deixadas pelo educador seriam uma boa receita. Segundo ele, não se pode basear uma crítica numa leitura superficial, nas primeiras impressões que temos.

Claro que, quando Paulo Freire tratou disso em “Pedagogia da Autonomia”, mencionava especificamente o comportamento do professor. Porém, penso que é possível ler a obra do autor pensando para além da sala de aula. Afinal, Freire sempre pensou a educação em conexão com a vida.

Ao falar sobre a ação do professor, Freire ressaltou que o docente não pode basear a “crítica a um autor na leitura feita por cima de uma ou outra de suas obras”. Tampouco teria o direito de sustentar seus argumentos tendo como referência outras pessoas, gente que talvez só tenha lido “a contracapa de um de seus livros”.

Essa orientação de Paulo Freire é maravilhosa. Chega a ser bíblica. A gente não fala do que não conhece. A gente não fala do que “conhece” apenas pelo olhar dos outros. A gente só fala quando conhece de verdade, com detalhes, profundidade e de forma contextualizada. E conhecer de fato implica em se envolver, aprofundar-se, conviver, observar…

A gente pode até não gostar, não concordar com a ideia, mas não critica sem conhecer.

Falando especificamente da Educação, o pensador afirmou que o professor não pode mentir. “O preparo científico do professor ou da professora deve coincidir com sua retidão ética.”

Não é lindo isso? E não seria fantástico se na escola e fora dela baseássemos nossas falas apenas naquilo que de fato conhecemos, sem distorções, sem mentiras?


Ronaldo Nezo
Jornalista e Professor
Especialista em Psicopedagogia
Mestre em Letras | Doutor em Educação

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